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quinta-feira, 3 de maio de 2012

Conversa de morto...



Hoje o sol esqueceu de nascer para mim...

Não assistirei o virar das horas
Meus filhos não foram à escola
Minha esposa não colocou feijão no fogo.
No meu trabalho, minha mesa está vazia
meus amigos, estranham minha falta
Minha página não foi atualizada
Sinto-me triste e abalado
mas não posso chorar...
Observo as pessoas
Estou vendo elas pelo avesso
Seus pensamentos e sentimentos
Devia ter tido antes esse direito:
A verdade está à mesa!

Um olhar de compaixão
-Tão novo!

Estava de terno...
Esse não me caiu bem,
era o do casamento...
Se estivesse de pé, com certeza,
aqueles sapatos me apertariam,
meu irmão que os trouxe,
os meus estavam velhos e surrados.
Senti meu perfume
mas não era em mim,
o primo da minha mulher o estava usando.
Agora eu tinha cheiro de cravo 
e fumaça de vela.

Um olhar de desprezo
- Já vai tarde!

O tempo corria acelerado
e eu imóvel protestava,
gritava, 
mas as palavras perdiam-se no silêncio...
Eu ouvia até o som de uma lágrima que caia
Os soluços dos meus filhos
O desalento de minha mãe
A revolta de meus irmãos
A resignação de minha esposa
A gargalhada de meu algoz

Um olhar de afeição
- Meu filhinho!

A sala ficou pequena
e eu deitado,
ocupando espaço.
Quantos olhares desconhecidos
Quantas perguntas sem resposta
Quantas vezes disseram amém
O tempo apressado
O buraco estava aberto
Por que consolavam minha esposa
e não me diziam uma palavra de conforto?

Um olhar de tripúdio
- Como ele está feio!

Meus filhos choram por saudade
Minha esposa, por vergonha
Minha mãe, por sofrimento
Meus amigos, pelo vazio
Meus irmãos, por justiça
E eu seco,
não posso chorar

Um olhar de solidariedade
- Coitado!

Apagaram as luzes
mas eu ainda enxergava
imóvel, o mundo passava por mim,
as últimas palavras foram ditas
o último clamor foi ouvido 
- um pouco depois que terra foi lançada
As pessoas se dispersaram 
Agora só restava meus filhos, 
minha mãe e meus irmãos
Minha esposa, essa já tinha fugido
amparada pelo primo foragido
que carregava em seu lombo
a alcunha de assassino.

Um olhar de terror
- Tô morto!

Meus olhos se abriram,
tinha sido baleado...
Meu cachorro latia desesperado,
quase quebrara a corrente
sorte dos bandidos 
que fugiram impunemente...
por meus filhos fui encontrado
ainda sentado no meu carro,
gritaram por socorro,
chamaram ambulância,
pediram que eu aguentasse...
...................................................
Minha esposa chegou como se nada soubesse
Fingiu uma dor que não estava sentido
sofria mais pelo desespero dos filhos
do que pelo marido perdido...
...................................................
No meu quarto o primo fingindo
de santo se disfarçava,
roubara minha mulher e meu perfume
só por que me invejava...

- Tô morto!
Gritei em silêncio,
meu momento aqui acabara:
Sem lágrimas, cegaram meus olhos
- Tô morto!
Aos 40 anos, fui morto...
...................................................
Deixei várias páginas em branco
e um perfil incompleto!

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